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Retextualização e o estudo com memórias

domingo, janeiro 11, 2015

Buscando informações sobre o trabalho relevante em sala de aula de Língua Portuguesa, recebi a sugestão de leitura de um texto acadêmico. O trabalho " A retextualização como trabalho didático", de Rosane de Mello, apresentado no Celsul, expõe que a reescrita textual é bastante utilizada para a aprendizagem da produção textual. É uma prática na qual observamos aspectos relativos às mudanças de um texto no seu interior. Vislumbra marcas sociais dos gêneros, mas fica limitada quanto aos usos sociais. 

A retextualização é considerada como a metodologia mais adequada para a aprendizagem de gênero textual na escola.

O gênero estudado pela professora é a anotação, usado por alunos e professores. 

Transcrição é o texto transcodificado da produção oral original, no qual se evitam pontuação, inserções e qualquer tipo de eliminação, traz indicações de situacionalidade e de qualidade de produção. A retextualização é um momento posterior, baseado em operações mais complexas, que realizam mudanças no texto-base (Marchschi, 2001).

Na anotação a compreensão é fundamental. Ela é considerada um gênero de reformulação de uma produção oral para outra escrita, a fim de preservar informações para uma posterior consulta. 

Ela é uma produção para o próprio escritor e depende das interpretações que ele faz na situação de sócio-comunicação em que se encontra. Algumas vezes essa anotação poderá ser retextualizada, tornar-se um relatório, uma resenha, uma memória, etc, mas também pode ser um texto final, com o simples objetivo de tomar notas.

São 9 as operações que acontecem na anotação:


  1.     Estratégia de eliminação – baseada na idealização lingüística, elimina marcas interacionais, hesitações da fala.
  2.                Pontuação – simula a entonação da fala.
  3.            Estratégia de eliminação com retirada de repetições, paráfrases, pronomes egóticos, reduplicações.
  4.          Produção de um resumo, simultânea a segunda operação, decisão de agrupamento do conteúdo, disposição do texto em blocos, marcação do início desses tópicos. – depende da consciência do aluno em disciplinar o texto.
  5.     Substituição e reorganização de natureza pragmática, substituindo palavras pelos nomes específicos (alguém, um lugar...).
  6.    Reconstrução de estruturas truncadas, concordâncias, reordenação sintática e encadeamentos.
  7.               Estratégia de substituição com vistas à uma maior formalidade.
  8.          Reordenação tópica do texto e da sequência argumentativa.
  9.   Estratégia de condensação de argumentos, transformando e não eliminando informações.
Segundo a autora, em um dos estudos realizados, durante uma palestra os alunos tomavam notas corridas, com frases coesas e coerentes, mas esparsas e raramente apresentavam marcas de oralidade. Já os presentes que não eram alunos, faziam esquemas e registravam palavras-chave, raramente apresentando frases, o que leva a crer que a retextualização depende dos objetivos do autor.

A professora observou também que ao retextualizar a palestra os autores retiravam informações que não consideravam relevantes, como a autoria da citação e a opinião do palestrante, o que pode vir a explicar uma reclamação constante dos professores de que os alunos não registram corretamente os comentários que eles fazem em sala de aula.

Em um curso que fiz, um professor constantemente avisava o que era para ser anotado e pedia que registrássemos com atenção o que ele dizia, uma outra professora solicitava que marcássemos palavras-chave na legislação brasileira referente ao ensino no Brasil. Penso se faria mesmo diferença em nossas aulas avisar aos alunos, que não são acostumados com essas anotações, haja vista a pergunta constante: “É para copiar?”. E isso eles perguntam não do que o professor diz e sim sobre as anotações que o mesmo fez no quadro. Segundo a autora, quando o aluno faz uma cópia, acreditando ser uma anotação ele comete um erro, age passivamente sobre o texto, ao invés de retextualizar, que implica uma ativa interação, transformando um texto oral em escrito, compreendendo-o, apropriando-se do seu conteúdo e de seu sentido, interferindo sobre o que aprendeu, uma “tradução endolígue” (Marcushci, 2001).

De acordo com Roseane o anotador deve saber escolher o que anotar, pois os sentidos são produzidos na relação do sujeito com a língua e pelos seus conhecimentos prévios.

Penso então que é importante os alunos conhecerem o currículo, saberem o que vão estudar e o que se espera que eles aprendam, auxiliando assim quais são as anotações relevantes e evitando que se ocorra o erro de anotações mal interpretadas. É interessante que se revise as anotações com os alunos. O professor pode questionar se o que foi anotado foi realmente o que ele quis dizer, ou mesmo, ter o cuidado de, se fizer um trocadilho, verificar se o aluno entendeu o que era para ser anotado e não tomar o trocadilho como verdade. Parece estranho, mas é comum quando não se tem domínio do que é exposto que se façam interpretações errôneas e que se escreva exatamente o contrário do que se quer dizer. Como a anotação é um texto para ser lido posteriormente, é necessário que os registros sejam claros e confiáveis.

É interessante o aluno compreender que para garantir o seu aprendizado no seu estudo futuro das anotações ele não precisa registrar exatamente tudo o que o professor fala, o que seria uma transcrição e não uma retextualização.

Há ainda pela análise da autora a presença de pronomes egóticos (eu, nós), nas anotações, que podem e, na minha opinião, devem ser suprimidos, como um exercício para a construção de uma argumentação. Isso pode demandar um tempo, já que é um aprendizado, mas é bastante válido, visto que comumente acabamos por criar hábitos de escrita.

Se eles registrarem, por exemplo, frases distantes, como tópicos apenas, segundo a autora, fica impossível estabelecer uma relação coesiva entre elas. A interveção do professor ao meu ver é essencial para que todos esses aspectos sejam trabalhados com os alunos.
Penso ser interessante o trabalho com memórias, textos feitos pelos alunos com vistas a expor os conhecimentos adquiridos nas aulas, fazer questionamentos e propor investigações. Os textos podem começar simples, com anotações primárias e se regulamentando aos poucos, atendendo as novas propostas, que precisam ser gradativas para não desanimar os autores.

Além de ser um aprendizado do gênero, facilita toda uma exposição de argumentos para a reconstrução de sentido dos textos, já que apresenta na prática muito o que se faz necessário em textos mais elaborados, como a dissertação argumentativa.
Estratégias de correção podem ser criadas em conjunto com os alunos, facilitando o trabalho do professor e possibilitando uma maior autonomia na reescrita e retextualização. Com o passar do tempo, os textos podem passar a investigativos e com uma criticidade aguçada. Tudo depende de como será conduzido o processo mediante as dificuldades apresentadas pelos alunos. Nesse ponto a postura do professor como mediador é fundamental. Construir junto é muito mais do que uma mera correção.



Referência: SANTO NICOLA, Rosane de Mello. A retextualização como trabalho didático. Celsul.
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